Relembrando Jornada nas Estrelas: A Nova Geração
(16 de ago. de 2016)
Jornada nas Estrelas havia completado seu 20º aniversário de existência. Jornada nas Estrelas IV havia sido o maior sucesso de bilheteria nos cinemas. Agora, mais que nunca, os fãs exigiam a volta das aventuras na televisão.
A Paramount, ciente disso, estava em negociações com Gene Roddenberry. Pelo fato dele ter direitos autorais envolvidos na franquia, a Paramount não podia deixar ele de lado como havia feito nos filmes.
O que ninguém esperava era que uma nova série seria feita sem Kirk, Spock, McCoy ou qualquer rosto conhecido.
Jornada nas Estrelas: A Nova Geração estreou em setembro de 1987, e durou sete temporadas, com um total de 178 episódios. A trama se passava 80 anos após os eventos da série original e seguia as aventuras de uma nova USS Enterprise, comandada por uma nova tripulação. Quando o elenco foi anunciado, muitos dos fãs reagiram mal. Como eram capazes de deixar Kirk e Spock de lado?
Assim como a série original teve de lutar para adquirir seus fãs, A Nova Geração lutou para vencer os corações dos fãs que já existiam. Foram anos de esforço para sair da sombra da obra original. Além disso, as duas primeiras temporadas foram caóticas tanto por trás dos bastidores quanto no resultado final duvidoso de muitos episódios.
Um dos problemas mais citados foi a presença de Leonard Maizlish, advogado de Gene Roddenberry. Encarregado de defender os interesses de seu cliente, Maizlish interferiu na produção do seriado de forma assustadora, a ponto de invadir as salas de roteiristas e reescrever roteiros em nome de Roddenberry. Infelizmente, isso afastou veteranos da série original como David Gerrold, Bob Justman e D.C. Fontana, que haviam vindo para a nova série à convite de Roddenberry. Como a saúde de Roddenberry entrou em declínio durante a produção, foi necessário organizar o alto escalão. Maurice Hurley, um dos roteiristas contratados por Maizlish, serviu como o produtor principal durante as duas primeiras temporadas, e também acabou saindo devido a discordâncias com Roddenberry.
Um dos representantes do estúdio, Rick Berman, que tinha a função de supervisionar a produção, garantindo que tudo corresse dentro do prazo e orçamento, acabou assumindo cada vez mais a produção geral. Após a saída de Hurley, Berman assumiu a série como produtor executivo. Uma decisão foi contratar o escritor Michael Piller para chefiar a sala dos roteiristas, enquanto Berman lidava com os atores e quaisquer pendências de produção. Foi assim que a série começou a engrenar, em plena terceira temporada.
Um estopim por trás de muitos conflitos entre os roteiristas era a visão do futuro que Roddenberry tinha. Para ele, a humanidade já teria superado a maioria de suas deficiências sócio-econômicas e políticas no Século XXIV, a ponto de não terem mais conflitos internos, crises econômicas ou até mesmo crimes comuns. Em resumo: viver em 2364 seria um paraíso. O problema é que para muitos roteiristas, isso era visto como um empecilho. Se conflito representa a base do drama, como criar histórias quando os personagens vêm de um mundo perfeito? Para Piller, e roteiristas talentosos como Jeri Taylor, Brannon Braga e Ronald D. Moore, essas limitações foram uma inspiração a fim de se desafiarem a criar histórias dramáticas dentro desse contexto. Vendo de fora, A Nova Geração é mais do que qualquer coisa uma representação do humanismo que Roddenberry defendia. União, paz, prosperidade. E esta foi uma série que assim como a original inspirou muitos, principalmente cientistas, professores e pensadores.
Todos devem lembrar da maioria do elenco. Patrick Stewart já era um ator veterano quando encarnou o Capitão Picard. Com sua experiência em Shakespeare, Stewart trouxe uma seriedade e profundidade para Picard que o distanciou de Kirk. Enquanto que Kirk era um homem de ação, Picard quase sempre procurava soluções diplomáticas ou científicas para quaisquer problemas que eles enfrentassem. Não era a toa que contrariar Picard era uma péssima decisão. A forma como ele transmite sua raiva e decepção davam a ele toda a autoridade necessária.
Já o Comandante Riker, vivido por Jonathan Frakes, lembra mais um pouco de Kirk. Ele começou como um jovem oficial altamente focado em sua carreira, mas que acabou se acomodando na Enterprise e deixando a ambição de lado.
O mais famoso personagem após Picard era sem dúvida o andróide Data (Brent Spiner). Criado pelo cientista Noonien Soong, ele mostrava um fascínio pela humanidade, e desejava um dia tornar-se humano. Contudo, levando em conta sua programação e origem, ele era incapaz de nutrir emoções, mas isso não o impedia de tentar dominar o humor dentre outras experiências. Sem dúvida, este era o novo Spock nessa nova geração, e foi provavelmente o personagem mais bem recebido pelos fãs, junto a Picard.
Havia também Worf (Michael Dorn), o primeiro Klingon servindo à bordo da frota estelar. Tendo um passado doloroso devido à morte do pai no massacre de Khitomer, Worf teve material de sobra a ser explorado no seriado. Sua dedicação a conceitos de honra Klingon era tão extrema que foi descobrindo que nem os próprios Klingons tinham tanta integridade.
Havia também personagens como Deanna Troi (Marina Sirtis), a terapeuta da nave, Beverly Crusher (Gates McFadden), a médica-chefe, Wesley Crusher (Wil Wheaton), seu filho-prodígio, e Geordi LaForge* (LeVar Burton), o engenheiro-chefe da nave que sofria de cegueira e usava um visor** especializado para enxergar. Logo de cara, A Nova Geração se apresentou como uma série distinta da original a dar foco a todos esses personagens, ao invés de focar em poucos.
*Geordi LaForge foi inspirado no tetraplégico George LaForge, fã da série original que conheceu Roddenberry e morreu em 1975.
**O visor era literalmente um clip de cabelo feminino que o designer Michael Okuda havia trazido para uma reunião de design para conceber o visor.
Além deles, tivemos também personagens como Tasha Yar (Denise Crosby), que foi a chefe de segurança da nave, mas foi morta ainda na primeira temporada no episódio Skin of Evil. A partir da segunda temporada, tivemos personagens recorrentes como a Doutora Pulaski (Diana Muldaur), o engenheiro/técnico de transporte Miles O'Brien (Colm Meaney), Reginald Barclay (Dwight Schultz) um engenheiro cheio de fobias que passava mais tempo no holodeck vivendo fantasias do que trabalhando, e por fim Guinan (Whoopi Goldberg), que cuidava do bar e era capaz de tratar dos problemas pessoais da tripulação de forma até melhor que Troi.
Goldberg era fã de Star Trek desde a série original, se inspirando em Nichelle Nichols como sua modelo. Quando A Nova Geração entrou em produção, Goldberg já era uma atriz consagrada e pediu para participar. Aparentemente, ninguém do estúdio acreditava que uma atriz daquele calibre e fama quisesse se envolver em TV*. Foi através do amigo LeVar Burton que ela conseguiu o papel de Guinan.
*Era realmente a década de 1980. TV ainda era vista como o meio inferior na época. Hoje em dia, atores de cinema procuram se envolver em TV principalmente pelo prestígio que o meio adquiriu nos últimos 15 anos.
E, em matéria de visuais, a diferença entre A Nova Geração e a série original era gritante. A Enterprise original parecia uma nave militar simples e prática. Já a nova parece um hotel viajante no espaço. Inclusive, tripulantes podem levar suas famílias à bordo já que essa missão se estende além dos cinco anos da série original.
E foram muitas aventuras nesses sete anos. Encontros com os Romulanos, tentativas de primeiro-contato com novas espécies, missões de pacificação, encontros com novas formas de vida, distorções espaciais, e muito mais. Tivemos episódios como The Offspring, no qual Data constrói uma filha, gerando revolta por parte da Frota Estelar, e levantando a questão de se andróides são cidadãos como humanos. Outro excelente episódio foi Cause and Effect, no qual a tripulação se encontra presa num loop temporal, sendo forçada a reviver o última dia antes da Enterprise ser destruída numa colisão. Teve também o inesquecível The Inner Light, no qual Picard é nocauteado por uma sonda alienígena e vive uma vida inteira como outro indivíduo em outro planeta, com direito a tudo que não teve em sua carreira, incluindo uma família.
A série também introduziu o holodeck, uma sala cuja tecnologia de projeções holográficas permitem ao visitante se envolver em diversas aventuras fictícias. É fato que a maioria dos episódios lidando com este artefato procuravam formas de colocar os personagens ao perigo ao criar um defeito que os impediriam de sair do programa.
De destaque nessas temporadas, também tivemos o primeiro encontro com os Borg. Formas de vida cibernéticas que operam coletivamente e assimilam todos aqueles em seu caminho, estes foram os adversários mais implacáveis já vistos em Jornada. Eles conseguiram assimilar Picard, e foi necessário todo o esforço da tripulação para trazê-lo de volta inteiro.
Gene Roddenberry morreu em 1991, durante a quinta temporada do seriado, após anos lidando com problemas de saúde.
Haviam personagens recorrentes como o onipotente Q (John De Lancie), um ser de poderes divinos que adorava atormentar Picard e seus colegas quando tinha vontade. Mas o personagem também serviu de alegoria sobre a responsabilidade do indivíduo que utiliza grandes poderes. Havia também Lwaxana Troi, a mãe de Deanna, que visitava a nave ocasionalmente tentando pressionar a filha ao casamento enquanto tentava conquistar o coração de Picard. Troi foi interpretada por Majel Barrett, veterana da série original e viúva de Roddenberry.
Até pelo viés pacifista, didático e a tentativa de evitar conflitos, fica a impressão atual de que A Nova Geração não envelheceu muito bem como série. E o fato de ser um produto de ficção científica garantiu que a série jamais seria reconhecida como um produto de qualidade no patamar de outras séries dramáticas. Certamente, ignorar a performance de Patrick Stewart foi um dos grandes erros. Mesmo assim, eles conseguiram uma indicação para o emmy de melhor série em sua última temporada.
A série ainda conseguiu incluir partes da série original. DeForest Kelley havia feito uma ponta como um McCoy envelhecido no episódio-piloto. James Doohan também reaparece como o engenheiro Scotty no episódio Relics, quando descobrem que ele havia permanecido preso num estado de teletransporte permanente por 70 anos.
As participações mais lembradas são sem dúvida as de Mark Lenard como Sarek, pai de Spock, nos estágios finais de sua vida, e por fim Leonard Nimoy que voltou como o vulcano num episódio de duas partes, assumindo um projeto de vida ajudando jovens romulanos a buscarem paz na lógica em busca de uma reunificação com os vulcanos.
Outro fator que diferenciou A Nova Geração da série original foi a disposição de certos atores em se expandir. Jonathan Frakes expressava interesse em dirigir. Rick Berman ofereceu a oportunidade desde que ele participasse de seminários, sessões de montagem e várias outras lições. Foi assim que Frakes conseguiu dirigir oito episódios. LeVar Burton seguiu o mesmo caminho, assim como Patrick Stewart. Frakes e Burton seguiram carreira e passaram a dirigir episódios de Deep Space Nine, Voyager e Enterprise.
Quando a série foi se aproximando do fim, começaram as especuações do que aconteceria. Superar a marca de três temporadas da série original foi uma vitória por si só. A questão era o quanto a série seria rentável para o estúdio. A questão principal é o elenco. Não são todos que tem a disposição para passar o resto da vida presos a uma série. Após meses negociando com a Paramount, Rick Berman estabeleceu que A Nova Geração terminaria em sua sétima temporada, e seguiria com filmes no cinema.
E assim a série chegou ao fim, em maio de 1994, com o episódio All Good Things.... Foi uma história que serviu como a oportunidade de explorar Picard e sua relação com sua tripulação de todas as formas ao rever seu passado, presente e visualizar um possível futuro, deixando claro que o fator mais importante na série sempre foi a força de seus personagens.
A série terminou num período de alta atividade para a franquia. O primeiro filme para os cinemas já estava em produção. A série Deep Space Nine estava em plena produção, e a nova série Voyager também estava sendo desenvolvida.
Star Trek estava apenas começando.....
Fique com duas cenas da série, logo abaixo:
Posted in Postado por Eduardo Jencarelli às 13:34
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